sábado, 17 de outubro de 2015

PAREM DE DIZER QUE DILMA É HONRADA

Parem de dizer que Dilma é honrada
Fernando Lomardo

     Não são poucos os artigos e editoriais que tenho lido examinando a caótica situação política e moral do país, e a responsabilidade da presidente nesse quadro. Mas uma afirmação recorrente me causa estranheza: a de que Dilma “não enriqueceu pessoalmente”. Atribuem a ela, no máximo, negligência ou incompetência. Nada de intenção na espoliação da Petrobras (que é só o que sabemos, por enquanto; quando estourarem Eletrobras, BNDES e outras, não quero nem ver como vamos dormir). Alguns, como o ex-presidente FHC, fazem questão de afirmar que Dilma é “honrada”, num momento em que as inúmeras mentiras da presidente já se escancaram por todo o planeta e, apesar disso, seu Ministro dos Retalhos não sabe fazer outra coisa além de taxar o contribuinte e tentar cortar mais da Previdência.

     Bem, meu conceito de honra é bem outro. Alguém honrado já teria admitido que mentiu. Alguém honrado já teria compreendido que não é capaz de tocar esse barco e teria pedido o boné. Alguém minimamente honrado não estaria se agarrando ao trono de forma covarde, esperneando desesperado, oferecendo ministérios em troca do próprio pescoço, quando aqueles deveriam ser ocupados por técnicos e especialistas capazes de enfrentar desafios e problemas e encontrar soluções no âmbito da gestão de Estado e não do bolso do contribuinte.

     Dilma está muito longe do que um simples dicionário define como honrado. Com sua empáfia, garantida apenas por cinismo e hipocrisia sem antecedentes, por fidelidade canina à mentira, talvez por mitomania patológica, Dilma disse que “não respeita delator”, porque ela mesma não traiu. Cerveró que o diga. Foi delatado covardemente pela presidente, que afirmou ter assinado a compra de Pasadena mediante relatório do pobre diretor – de resto, outro corrupto – como se ela, presidente do Conselho de Administração, não tivesse a obrigação de ler detalhadamente a porcaria do relatório e identificar ali as falhas, irregularidades, incongruências. Ou seja, Dilma o responsabilizou – em bom português, Dilma culpou o diretor internacional da Petrobras na tentativa de isentar-se da própria culpa. Entregou um colega para tirar o seu da reta. Se isso não é uma delação, digam-me o que é.

     Por favor, jornalistas, “especialistas” e editores, parem de dizer que Dilma é “honrada”. Parem de dizer que Dilma “não enriqueceu pessoalmente”. Como é que vocês sabem? Têm por acaso acesso ao extrato bancário da dona? As contas dela foram devassadas? Seu patrimônio foi levantado? Como podem ter tanta certeza? Por quê essa ansiedade em assegurar a honradez de uma mulher diretamente envolvida na maior operação de desvio de dinheiro público da história política da humanidade?

     Se, do ponto de vista judicial, a dita “presunção da inocência” e as melífluas armadilhas interpretativas sobre fatos “anteriores ao mandato” permitem que a vastidão de evidências contra Dilma permaneça ignorada, do ponto de vista meramente factual o povo já tomou sua decisão. Contra fatos não há argumentos, e os fatos da realidade são diferentes dos fatos jurídicos. Se a justiça (ainda mais essa nossa justiça) continua insistindo na presunção da inocência, a sociedade já protocolou e assinou sua presunção de culpa.

domingo, 4 de outubro de 2015

A DEFESA DO BANDITISMO DISFARÇADA DE CRÍTICA SOCIAL - Fernando Lomardo

    O jornal O Estado de São Paulo publicou, em sua edição de 03 de outubro de 2015, um artigo do sociólogo José de Souza Martins, que pode ser acessado no link abaixo:

     http://alias.estadao.com.br/noticias/geral,historia-que-se-arrasta,10000000191

     O autor critica a ação preventiva da polícia carioca contra os arrastões nas praias, comparando-a a ações do tempo da Abolição, e justifica o arrastão como manifestação legítima das comunidades "excluídas".

     O texto abaixo é minha resposta a este artigo:

A DEFESA DO BANDITISMO DISFARÇADA DE CRÍTICA SOCIAL
Fernando Lomardo

     “Ladrão que rouba ladrão tem 100 anos de perdão”. (Ditado popular).

     Parece ser esse, em suma, o “ensinamento” que o sociólogo José de Souza Martins pretende nos transmitir em seu artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo, em 03 de outubro de 2015. Os menores que praticam arrastão nas praias do Rio têm o direito de roubar, pois a sociedade – melhor dizendo, a “elite” – roubou deles o acesso a um lugar ou a um “pertencimento” (conceito acadêmico de bolso, mais ou menos recente e que justifica qualquer distorção em favor de supostos direitos sociais).

     A princípio, o texto pode parecer despeito de paulistano. O simples uso da palavra “periferia” escancara um certo desconhecimento da vida no Rio, já que aqui a favela está geograficamente entranhada em toda a cidade, inclusive na supostamente glamourosa Zona Sul, e a palavra ”periferia” pouco se faz presente no vocabulário carioca.

     Mas não nos enganemos. É muito pouco atribuir as mirabolantes distorções do artigo a uma simples “rivalidade”, responsável por pérolas como “a praia é um faz-de-conta”. Não. Muito pelo contrário, o texto do senhor Martins é bem cuidadosamente articulado através de clichês socio-econômicos cujo objetivo é colocar-se em defesa de supostos excluídos e justificar ações, programas e estudos, na esfera pública e privada, que acabam movimentando milhões em reais, anualmente.

     A opção pelo conceito de “ostentação” para ilustrar o comportamento dos banhistas, ricos ou pobres, mostra o quanto o autor está na moda. Penso mesmo que ele deveria, ao invés de escrever um artigo, compor um funk carioca. Antenado com a atualidade, lança mão de todos os lugares-comuns que o discurso politicamente correto (inclua-se aí mídia, políticos e acadêmicos) tem disparado em sua cruzada contra o “preconceito”.

     A comparação com a Lei de Repressão à Vadiagem é mais frágil que um cubo de gelo largado no sol. Não existia, na época da Abolição, nada remotamente comparável à violência urbana hoje presente nas metrópoles brasileiras (e gradativamente migrando para cidades menores, como resultado da repressão a esses pobres excluídos que são obrigados a roubar e matar). Autores como Nabuco já haviam prevenido sobre o “14 de maio” (o período imediatamente posterior à abolição), antevendo que seria flagrante a falta de opção dos ex-escravos.  Os dois quadros sociais são tão semelhantes entre si quanto uma banana e um computador, assim como as ações neles contidas: a detenção, efetivamente injusta, de um sujeito que não está fazendo absolutamente nada (em 1888) e a ação preventiva contra grupos que efetivamente se preparam para roubar, agredir e, conforme o caso, matar (em 2015, ou 1992, como bem ilustrou o artigo de Mario Vitor Rodrigues publicado no Blog do Noblat).

     Torna-se inevitável citar um pensador irlandês, o que vai jogar mais lenha na fogueira. Afinal de contas, Oscar Wilde era branco, aristocrático e europeu, ou seja, o típico exemplar de uma Elite Colonialista Imperialista Opressora Responsável Pela Desigualdade Social Dos Países Do Terceiro Mundo Secularmente Explorados Pelo Invasor Estrangeiro, de acordo com o Dicionário Nacional de Clichês Acadêmicos. Em contrapartida, era homo-erótico, o que talvez lhe assegure um lugarzinho na última fila dos esquerdistas de botequim.

     A citação é: “Só os superficiais não julgam pelas aparências”. Tradução: as aparências não enganam. Não há grande dificuldade de diferenciar bandidinhos menores de idade de um rapaz comum que está apenas indo para a praia. Bandidinhos andam em grandes bandos, como esclarece a etimologia (bandido = membro de bando), pulam roletas de ônibus ou entram pela janela, ameaçam motoristas, cobradores e passageiros, cantam proibidões em altos brados, propagando crimes como “derrubei o avião” (helicóptero da polícia), “vou meter o três-oitão” (revólver calibre 38), “na favela vai morrer” (o policial ou o cidadão), entre outras ações de óbvia manifestação de ódio, discriminação e violência.

     Não é fato que não possuem sinais de pertencimento. Possuem e muitos, na própria pele. Escarificações à base de canivetes ou cacos de vidro. “Na pele dura mais”, disse um interno de instituição socio-educativa a uma professora. E apontam o pertencimento pelo qual optaram: siglas como CV ou ADA, indicativas de grupos criminosos contados entre os mais perigosos e violentos do mundo.

    À “cerca invisível”, ao “bloqueio simbólico” e outras facilidades retóricas pretensiosas, disfarçadas de análise social, se contrapõem, avassaladores, o assalto, o roubo e a agressão concretos, bem visíveis e reais. Uma facada na barriga não é simbólica. Um cordão arrancado, deixando marcas de sangue no pescoço, não é invisível. Invisível, mesmo secreto, talvez seja o que move esses acadêmicos de boteco a defenderem bandidos.


     Esse tipinho de discurso sustenta uma vertente lucrativa da atuação acadêmica, assim como da política: a defesa das chamadas “políticas afirmativas” e outras ações e iniciativas de “recuperação”, que movimentam milhões de reais em dinheiro público e privado, através de programas de governo e de iniciativas de empresas e do Terceiro Setor. Não sei se o autor do artigo faz parte deste tipo de grupo. Se não faz, talvez esteja louco para entrar.

ARRASTANDO DEMAGOGIA, de Mario Vitor Rodrigues

ARRASTANDO DEMAGOGIA – Mario Vitor Rodrigues
http://noblat.oglobo.globo.com/artigos/noticia/2015/09/arrastando-demagogia.html
27/09/2015

     Uma parede humana avança sobre os banhistas; pavor e insegurança. Sem que se saiba de onde, começa uma grande confusão, o pânico toma conta da praia. As pessoas correm em todas as direções, são mulheres, crianças, pessoas desesperadas à procura de um lugar seguro. A violência aumenta quando gangues rivais se encontram. Este grupo cerca um rapaz que cai na areia e é espancado. A poucos metros dali, outro bando avança sobre a quadra de vôlei, os jogadores se afastam e cercam as barracas para proteger mulheres e crianças. Dois policiais, apenas dois, chegam até a areia, eles estão armados mas parecem não saber o que fazer com tanta confusão e correria. Perto dali, um rapaz ignora a chegada dos policiais para roubar. Ele se abaixa, pega uma bolsa de praia e corre. Veja de novo, ele é seguido pelos companheiros de gangue, que impedem a aproximação das pessoas.

Se ainda existiam dúvidas sobre a profundidade alcançada pelas garras do populismo de esquerda entre nós, desde o último fim de semana já não faz mais sentido tê-las. Não após o nível do debate provocado pelos arrastões em Ipanema.

Afirmo sem medo, jamais teria vez em uma sociedade lúcida, para não dizer bem intencionada, a inversão de valores defendida nas abordagens sobre o tema. Uma ladainha já conhecida, neste caso determinada a relativizar furtos e assaltos, que teve como alicerces as falácias de sempre: injustiça social, racismo e violência policial.

Sobre o primeiro ponto, sequer vale a pena estabelecer comparações com países de perfis sócio-econômicos similares ao nosso. Seria dar fôlego aos interessados em se aproveitar do mais puro e simples banditismo para fortalecer discurso ideológico.

Já a premissa de amalgamar pessoas ao bel-prazer, diga-se, utilizando a cor da pele como desculpa, é oriunda da mesma conversa. A partir de então, fica cômodo colar selos no indivíduo e instrumentalizá-lo em benefício próprio. Nem que seja para posar de bom moço em papo de bar, ao julgar e absolver seus crimes.

Quanto aos abusos da polícia, obviamente devem ser observados com atenção pela sociedade, interessa a todos que o rigor da lei também se imponha aos bandidos de farda. Mas nada justifica engolir discurso orquestrado para impor generalizações interesseiras - como por exemplo, de que nem todo favelado seja bandido, mas de que todo policial necessariamente seja violento, fascista e corrupto.

Nesta hipótese, percebam, não resta saída para a polícia. Se decidir esperar pela ação criminosa, falhará duplamente, antes, por ter permitido o delito, e depois, ao usar de força excessiva na hora de deter o bandido. Se, por outro lado, decidir prevenir, como qualquer polícia deve fazer, será acusada de preconceito. Uma armadilha retórica boçal, mas que virou dogma de tão difundida.

Claro que a popularidade deste nocivo raciocínio não foi alcançada da noite para o dia. Muito pelo contrário, representa uma construção iniciada há décadas, tanto nas escolas, como nas faculdades, via jornalistas e formadores de opinião. Graças a ela, noves fora a já fossilizada culpa católica, o brasileiro emburreceu a ponto de aceitar com normalidade a carapuça de carrasco. Até mesmo em casos assim, quando claramente é a vítima.

Antes de regurgitarmos ideias falidas, seria mais sensato lembrar os milhões de “pretos e favelados”, como gostam de dizer os arautos da superioridade moral, que certamente não têm vida fácil, mas saem de casa todo dia para trabalhar honestamente, e não para se divertir saqueando, impondo o terror e agredindo quem encontrarem pela frente.

em tempo: Ainda ontem, o adolescente flagrado durante o arrastão declarou ao O Globo que roubou “por prazer”. Torço para que sua declaração sirva pra intimidar um pouco quem, consciente ou inconscientemente, ajuda a subverter um mínimo de bom senso que ainda deveria nos restar.

Fulanos assim, que saem de casa para roubar e agredir, que superlotam ônibus e comportam-se de maneira ameaçadora, devem, sim, ser detidos pela polícia. O que não pode, é um comportamento claramente anormal, de afronta, ser contemplado candidamente como se nada fosse, quando todos sabemos muito bem do que se trata.


O que, aliás, o trecho em destaque no início deste artigo - transcrito de uma reportagem veiculada no Jornal Nacional, sobre um arrastão na mesma Ipanema há 23 anos -, deixa muito claro.


sexta-feira, 25 de setembro de 2015

TÁ PENSANDO QUE EU SOU POLÍTICO?

     TÁ PENSANDO QUE EU SOU POLÍTICO?


     O Palhaço sempre foi visto como o inverso do homem social. Avesso à seriedade e ao compromisso, tem muito de atrapalhado e algo de preguiçoso. Representa o deboche e o escárnio, mas também a pureza e a ingenuidade. Por estes atributos, é sempre vilipendiado por alguém mais esperto; geralmente é enganado, espoliado, lesado, e ainda apanha e leva uns tombos. Tudo de ruim acontece com o Palhaço. Mas ele sempre segue em frente recuperando o bem estar e a alegria, a esperança de dias melhores e a fé na humanidade. Como um desenho animado, o Palhaço nunca se machuca.

     Daí ser o Palhaço o símbolo do homem lesado, por sua ingenuidade. Muitas vezes, por sua burrice. Ao se ver em uma situação de iminente ou rematado prejuízo, o homem comum protesta: “Tá pensando que eu sou palhaço”? Só o palhaço pode ser lesado impunemente. O palhaço pode ser sacaneado à vontade, ele nunca vai reclamar. Mas permanece inalterada sua envergadura moral, sua honestidade, sua solidariedade, sua dedicação ao outro.

     Por outro lado, o Político, ao menos no Brasil, já ultrapassou o âmbito do mero substantivo para se tornar um sinônimo: sinônimo de desonestidade, de dissimulação, de falta de caráter, de covardia. O Político banalizou o furto, a apropriação indébita, o roubo. O homem comum constata: “todo mundo que chega “lá em cima” (metáfora para o poder e a plena liberdade de praticar atos ilícitos) rouba; você não roubaria também”? Pronto. O roubo está banalizado, na preguiçosa e subserviente ótica da população brasileira. Roubar é lícito, desde que seja por um político, pois políticos podem tudo, escondidos em sua capa de legitimidade supostamente garantida pelo voto de um povo que respeita o ladrão institucional.

     Você prefere ser Palhaço ou Político? Não tenho dúvidas de que 90% da população brasileira preferirá o Político. Não trabalha, recebe salários milionários, se aposenta com oito anos, tem tudo de graça (apartamento, carro, terno, passagem de avião, talvez não pague nem pelo palito de dente), pode aumentar o próprio salário (é a única categoria do mundo que pode fazer isso) e, principalmente, pode roubar à vontade. Já o Palhaço não ganha porra nenhuma (a menos que seja do Cirque du Soleil, mas aí já é outro palhaço, fashion-cult-pós-hightech), leva porrada, não se aposenta nunca (vejam só o Carequinha, ou o Arrelia, que trabalharam até o fim da vida) e é, sobretudo, incorruptível.


     Por estes aspectos, não faz sentido que alguém, envolvido inadvertidamente em algum tipo de falcatrua, proteste: “Tá pensando que eu sou Palhaço”? Faz mais sentido que ele diga “Tá pensando que eu sou Político”?, pois este é o seu terreno: o terreno da enganação, do vilipêndio, do “dar uma volta”, “dar um chapéu”, “levar na conversa”, “passar um cheque sem fundos”, é o terreno do Político. Deixa o Palhaço em paz. É atribuição do Político (já que lidam uns com os outros) enrolar e ser enrolado, enganar e ser enganado, mentir e corromper. Sim, eu sei que o Palhaço é aquele que é enganado; e o Político é aquele que engana. Por isso, faz sentido perguntar “Tá pensando que eu sou Palhaço”? Mas proponho essa inversão pela necessidade da circunscrição de territórios. Se a mentira e a enganação são o ofício do Político, deixemo-lo responsável por ele, como agente ativo ou passivo. Se o Palhaço é antes de tudo honesto, deixemo-lo em seu território, longe dos perigos devastadores representados por uma eleição. E a cada vez que você se vir envolvido, direta ou indiretamente, em qualquer situação que caracterize mentira, hipocrisia, enganação, vilania, falta de caráter, falta de coragem, pusilanimidade, encha os pulmões e pergunte com todas as letras “TÁ PENSANDO QUE EU SOU POLÍTICO”?


quinta-feira, 27 de agosto de 2015

Anos de chumbo e concreto

Anos de chumbo e concreto
Pedro Henrique Pedreira Campos

     Foi durante a ditadura que as grandes empreiteiras consolidaram seu poder, em íntimas ligações com o Estado

     1/6/2015 


     A Operação Lava Jato, deflagrada em 2014 em ação conjunta da Polícia Federal e do Ministério Público, colocou atrás das grades dirigentes executivos das maiores empresas brasileiras de engenharia. As investigações revelaram que as empreiteiras se organizavam na forma de cartel e mantinham esquemas de corrupção em contratos com a Petrobras. Mas este tipo de relação promíscua entre empresários e órgãos públicos não é exatamente uma novidade. O poder e a influência política dos empreiteiros de grandes obras devem muito ao período da ditadura civil-militar.

     As principais empresas do ramo foram fundadas entre as décadas de 1930 e 1950, momento em que o eixo do desenvolvimento econômico brasileiro se deslocava do campo para as cidades. Para dar conta desse processo, foi montada uma infraestrutura voltada ao desenvolvimento da indústria, com empreendimentos principalmente nas áreas de energia e de transporte. O Estado demandou grandes obras para as corporações de engenharia, ajudando a impulsionar o desenvolvimento industrial. Camargo Corrêa (1939), Andrade Gutierrez (1948), Queiroz Galvão (1953), Mendes Junior (1953)... como o nome da maior parte dessas empresas indica, elas tiveram em sua origem (e têm até hoje) o controle eminentemente familiar.

     O governo Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi muito importante para o desenvolvimento das empreiteiras, encomendando-lhes as rodovias previstas no Plano de Metas e as obras da nova capital federal, Brasília. As corporações do setor tiveram então um crescimento impressionante. De pequenas e médias empresas locais tornaram-se grandes firmas nacionais. Nos anos e nas décadas seguintes, sob a ditadura, as construtoras alcançaram uma expansão sem precedentes, em virtude de políticas estatais favoráveis às atividades do setor, incluindo um intenso programa de obras públicas. Formaram-se grandes grupos na indústria de construção pesada. Com incentivo estatal, as empresas se ramificaram para outros setores econômicos, e desde 1968 passaram a realizar obras também em diversos países. Foi a ditadura a responsável pela gestação de grandes conglomerados internacionais liderados pelas empreiteiras. E o poder conquistado por esses grupos consolidou-se de tal forma que não foi abalado nem com a transição do regime político, na década de 1980.

     Ainda no período Kubitschek, os empresários da construção passaram a se organizar em associações e sindicatos nacionais. Foram criadas entidades como a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e o Sindicato Nacional da Construção Pesada (Sinicon) – que desempenhariam papel relevante na desestabilização do governo João Goulart e na deflagração do golpe civil-militar. Diretores dessas entidades participavam também do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes), que reunia oficiais da Escola Superior de Guerra (ESG) e representantes de empresas multinacionais e assumiria ativamente a campanha para derrubar João Goulart. Caso emblemático foi o de Haroldo Poland, presidente da empreiteira carioca Metropolitana, ex-presidente do Sinicon e que desempenhava função fundamental dentro do Ipes. Ligado a oficiais militares, Poland foi um dos agentes civis mais importantes no golpe de 1964.

     Ao longo da ditadura, esses organismos fortaleceram sua atuação junto ao Estado, conquistando livre trânsito em certas agências e influenciando a agenda das políticas públicas nacionais. Enquanto as organizações populares e os sindicatos dos trabalhadores eram cerceados e suas lideranças perseguidas, não havia o mesmo tipo de repressão às organizações representativas das empresas da construção civil, que se multiplicavam e tinham intensa proximidade com certas figuras do governo. A Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT) e a União Nacional dos Estudantes (UNE) foram fechadas pela ditadura, enquanto continuavam sendo criadas entidades de empresários da engenharia, como a Associação Brasileira de Engenharia Industrial (1964), o Sindicato da Construção Pesada de São Paulo (1968) e a Associação de Empreiteiros do Estado do Rio de Janeiro (em 1975).

     A política de repressão e terrorismo de Estado contou com o apoio, inclusive financeiro, de empresários e empreiteiros. A Camargo Corrêa foi uma das empresas que contribuíram com iniciativas para desbaratar a esquerda armada e suas organizações, usando métodos que incluíam tortura e assassinatos. A mais conhecida foi a chamada Operação Bandeirantes, financiada por empresas como grupo Ultra, Camargo Corrêa, Folha de S. Paulo, Nestlé, General Electric, Mercedes-Benz e Siemens.

     Grandiosos empreendimentos foram realizados durante o regime, fortalecendo as maiores construtoras, que ficaram responsáveis pelas principais obras do período. Itaipu e outras hidrelétricas de grande porte, a Transamazônica e outras rodovias em diversas regiões do país, a Ferrovia do Aço e projetos no setor ferroviário, os metrôs do Rio e de São Paulo, os conjuntos habitacionais do Banco Nacional de Habitação (BNH, criado em 1964), as usinas termonucleares de Angra dos Reis e a ponte Rio-Niterói foram alguns dos projetos de grande envergadura que saíram do papel naquele período.

     Com o suporte institucional do AI-5, em 1969 o governo estabeleceu reserva de mercado para as obras públicas realizadas no Brasil: a partir de então, somente companhias sediadas no país e com controle nacional poderiam ser contratadas. Várias outras medidas beneficiaram o empresariado, como isenções fiscais, financiamento público de obras internas e no exterior, entre outras decisões que ampliavam as margens de lucro da iniciativa privada. Em relação às políticas trabalhistas, também houve favorecimento generalizado aos empresários, e aos empreiteiros em particular. Medidas de “arrocho” salarial implantadas a partir do golpe beneficiavam companhias que empregavam numerosa força de trabalho, caso das empreiteiras. A repressão aos sindicatos permitia que as empresas ignorassem as demandas dos operários por melhores condições de trabalho. Com fiscalização relapsa em relação à segurança, o país virou recordista internacional em acidentes de trabalho – no auge da ditadura, chegou-se a registrar 5 mil trabalhadores mortos por ano, e o setor de construção civil era um dos principais responsáveis por essas estatísticas.

     Para as empresas de engenharia era rentável manter condições inadequadas e perigosas nas obras e não dar atenção à saúde do funcionário, visto que as multas – quando aplicadas – eram de reduzido valor. Quando ocorriam acidentes, era prática corrente culpar o próprio trabalhador, isentando o empregador da sua responsabilidade. Não à toa, ao final do regime, em meio ao processo de abertura política, eclodiram diversas greves, revoltas e motins em canteiros de obras, inclusive em grandes empreendimentos como a usina de Tucuruí, erguida entre 1976 e 1984 em plena selva amazônica.

     Sob as bênçãos da ditadura, o Brasil viu consolidar-se um capital de novo porte, monopolista em alguns setores da economia – e entre estes destacou-se a construção civil. Alguns poucos grupos chegaram a um patamar diferente, extremamente vigoroso, detendo amplo poder econômico e político. As principais empresas beneficiadas foram Odebrecht (Norberto Odebrecht), Camargo Corrêa (Sebastião Camargo), Andrade Gutierrez (Sérgio Andrade) e Mendes Júnior (Murillo Mendes). Dentre os agentes políticos da ditadura associados aos empreiteiros, destacam-se Mario Andreazza (ministro dos Transportes de 1967 a 1974 e do Interior de 1979 a 1985), Eliseu Resende (diretor do Departamento Nacional de Estradas de      Rodagem [DNER] e ministro dos Transportes de 1979 e 1982) e Delfim Netto (ministro da Fazenda de 1967 a 1974). O cenário forjado nos anos 1960 e 1970 foi altamente favorável ao crescimento das atividades dessas empresas, em ambiente propício para a acumulação de capital. A participação ativa que esses e outros empresários tiveram junto ao governo é mais uma prova de que o regime não foi somente militar, mas também civil, com corporações e Estado de mãos dadas em esquemas de favorecimento mútuo. Um casamento que, tudo indica, resistiu incólume à mudança de regime, e persiste em tempos democráticos.

Pedro Henrique Pedreira Campos é professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e autor de Estranhas Catedrais: as empreiteiras brasileiras e a ditadura civil-militar brasileira, 1964-1988 (Eduff, 2014).

     Saiba mais

     CRUZ, Sebastião Velasco. Empresariado e Estado na Transição Brasileira: um estudo sobre a economia política do autoritarismo (1974-1977). Campinas/São Paulo: EdUnicamp/ Fapesp, 1995.

     DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1981.

     FONTES, Virgínia & MENDONÇA, Sonia Regina de. História do Brasil Recente: 1964-1992. 4. ed. atualizada. São Paulo: Ática, 1996 [1988].

     LEMOS, Renato. “Contrarrevolução, ditadura e democracia no Brasil”. In: SILVA, Carla Luciana; CALIL, Gilberto Grassi & SILVA, Marco Antônio Both da (orgs.). Ditaduras e Democracias: estudos sobre hegemonia, poder e regimes políticos no Brasil (1945-2014). Porto Alegre: FCM, 2014.

     Filme


     Cidadão Boilesen (Chaim Litewski, 2009)

domingo, 25 de agosto de 2013


  E aqui vamos nós, mantendo acesa a chama da música de Jeff Buckley, “a gota cristalina num oceano de ruídos”, nas palavras de Bob Dylan. Seguimos fazendo poucos shows, para público restrito, garimpo de formiga na cidade do samba e do funk. Este show foi no dia 08 de dezembro de 2012, em Botafogo.


terça-feira, 7 de setembro de 2010

sated/SP EM SOROCABA: O PASSO A PASSO DE UMA USURPAÇÃO

Detalhando a questão abordada com brevidade nas postagens anteriores, aqui vai um passo a passo dos primeiros acontecimentos:

1 – 23/08/2010 – ricardo vasconcelos, diretor do conselho de ética (sic) do sated/SP, ameaça a ATS – Associação Teatral de Sorocaba.

De: Ricardo Vasconcelos
Assunto: FESTIVAL LIVRE DE TEATRO DE SOROCABA
Data: Segunda-feira, 23 de Agosto de 2010, 17:30


À PRODUÇÃO DOS ESPETÁCULOS TEATRAIS DO FESTIVAL LIVRE DE SOROCABA

Pelo presente comunicamos que ate a presente data esta entidade sindical não recebeu os seguintes documentos referente a produção “

Contratos de trabalhos;
Registro Profissional – DRT de artistas e técnicos;
Contribuições sindicais/ negociais;

Cumpre-nos o dever de esclarecer que os Contratos de Trabalho/ Notas Contratuais deverão obrigatoriamente ser encaminhados para o SATED/SP, juntamente com as Contribuições Sindicais recolhidas, para análise e posterior visto conforme a Lei 6533/78 e Decreto 82.385/78.

A Não regularização das pendências acima elencadas implicará em sanções, denuncias do exercício ilegal da profissão, crime de falsidade ideológica, ficando a Empresa e seus diretores, impedidos de receberem qualquer beneficio e incentivo ou subvenção, concedidos por órgão públicos. No caso de incidência, reincidência, embaraço ou resistência á fiscalização, emprego de artifício ou simulação com o objetivo de fraudar a Lei serão autuados, e a multa será aplicada em seu valor máximo, além das sanções legais jurídicas e criminais dos órgãos competentes.

Informamos que todos os envolvidos inclusive o teatro/sala de espetáculos respondem solidariamente pelo cumprimento das obrigações legais e contratuais.

Para verificar a situação desta produção solicitamos dirigir-se ao departamento contratos/ fiscalização sito Av. são João 1086 conj. 401/402 no prazo de 72 horas.

Atenciosamente,

Ricardo Vasconcelos
Dir. Conselho de Fiscalização do Trabalho e Ética Profissional


2 – 25/08/2010 – A ATS responde a ricardo vasconcelos

25 de agosto de 2010
Ilmo Sr. Ricardo Vasconcelos,

Conforme entendimento com o SATED Sorocaba, ficou acertado que a regularização dos artistas participantes no festival seria posterior a realização do VI FLITS.
Conforme solicitado, informamos também, aos artistas sem o DRT, que o Sated estaria fazendo um plantão na praça Frei Baraúna para regularizar a situação profissional dos mesmos.
A ATS é uma entidade sem fins lucrativos e depende de verbas e patrocínios para realizar essa e outras manifestações artísticas. Nos causou estranheza portanto, o teor do vosso email, encaminhado a esses apoiadores, imprensa, classe artística etc. Não somos uma entidade irresponsável . Não queremos de forma alguma infringir nenhuma lei, mas tão somente apoiar o teatro em Sorocaba e proporcionar ao público o fruir da nossa arte .
Abaixo, colo para facilidade de leitura, a carta do Mario Persico referente ao apoio do Sated à realização do VI Flits.
Gostaria de saber se podemos ou não realizar o festival e, por favor Sr.Ricardo, me responda - por que se uma lei data de 1978 somente agora esta sendo colocada em prática? Ja tivemos muitos festivais em Sorocaba e sabemos da realização de inúmeros festivais em outras cidades sem essas exigências de possuir o registro profissional e ser sindicalizado. Ademais, o regulamento do FLITS é aberto a grupos profissionais e amadores. Amadores não podem mais participar de festivais como o nosso, em que apenas se repassa aos grupos uma ajuda de custo para as despesas inerentes a sua própria participação no festival?
Solicitamos uma resposta urgente, menos que 72 horas - me perdoe - não para pressionar, mas tão somente porque não temos prazo para aguardar, sob pena da não realização do VI FLITS.
Reiteramos, não querer infringir nenhuma lei e contamos com o apoio do Sindicato dos Artistas para a realização do VI Festival de Teatro de Sorocaba.
Atenciosamente,
Nanaia de Simas - Presidente da Associação Teatral de Sorocaba -ATS

3 – 25/08/2010 – Arrogante e onipotente, o sated reitera a ameaça

São Paulo, 25 d Agosto de 2010

Assunto: Providencias - FLiTS

Prezados Senhores

Antecipadamente agradeço o pronto retorno de nossa correspondência, sobre o assunto em referencia, .
Primeiramente esclarecemos que o SatedSP, tem por obrigação estatutária e amparado na Lei 6533/78 e Decreto Lei 82.385/78, o dever de fazer cumprir, a lei é para todos, que exige Registro Profissional ou AUTORIZAÇÃO de trabalho e ter os contratos visados por essa entidade, além do recolhimento das devidas taxas.
Nos preocupa quando um profissional envolvido na Arte e Cultura questiona uma Lei que o protege.
Nos causa estranheza tal afirmação por se tratar de assunto longamente debatido em outras ocasiões na presença de todas as partes envolvidas, pois fica a sensação de que se fazer cumprir a Lei é crime. No nosso entendimento, não cumpri-la é sim crime.
Posto isso, diante do contato via email e telefone dos representantes da ATS, buscamos através do nosso jurídico orientação que insistiu na postura do SATED/SP, porém sem ferir os tramites legais previstos em Lei e que o Público e os Artistas não sejam prejudicados,

Por parte dos grupos, os artistas e os técnicos envolvidos no -FLiTS - Festival Livre de Sorocaba, a parte Administrativa dos processos de Autorização ou Registro Profissional deve ser efetuada com urgência.
Cumprindo-se a parte Administrativa, ainda que gradativamente a medida que cada um dos grupos compareçam e todos os processos sejam concluídos, o SATED/SP, fornecerá o documento de validação para a realização dos espetáculos.
Entendemos que a parte operacional administrativa, se estenderá durante todos os dias do Festival, e que a sua conclusão se dará após o termino do mesmo.
Os Senhores André e Mario Pérsico que representam o Sated/SP em Sorocaba e Região, deverão ser contatados para organização dos recebimentos documentos, que estamos enviando anexo para conhecimento e utilização quando necessário, para:

CAPACITAÇÃO PROFISSIONAL - DRT PROVISÓRIO, DEFINITIVO OU AUTORIZAÇÃO DE TRABALHO
VISTO SINDICAL - CONTRATO DE PARTICIPAÇÃO MUTUA OU NOTA CONTRATUAL
CONTRIBUIÇÃO SINDICAL

Informamos ainda que estes documentos também foram enviados ao Sr. Ricardo da ATS.

4 – 25/08/2010 – A Secretaria de Cultura de Sorocaba (SeCult) responde ao sated

José Gagliardi Junior
Para Ricardo Vasconcelos, Nanaia de Simas
Enviada:quarta-feira, 25 de agosto de 2010 12:09:07
Para: Ricardo Vasconcelos (conselhoetica@satedsp.org.br)
Cc: Nanaia de Simas

Prezado Doutor

Informo que continuamos aguardando documentos, conforme solicitado à Sra. Lygia, em reunião realizada nesta Secretaria, para análise das questões pela Secretaria de Negócios Jurídicos da Prefeitura.
Não pode o Poder Público pactur com irregularidades e práticas em desacordo com a lei, porém, não é atribuição da Secretaria da Cultura, desenvolver atividades e trabalhos unicamente voltados a profissionais. Nossos projetos visam à formação de público e de novos talentos. Se necessário, caso não haja regularização por parte dos interessados, poderemos suspender todas as ações voltadas à área, iniciando análise jurídica do caso.

José Gagliardi Jr
Chefe da Divisão de Programas e Projetos Culturais

Secretaria da Cultura e Lazer

5 – 25/08/2010 – A ATS propõe à Secult o cancelamento do VI FLITS

25 de agosto de 2010

Zezo,
Acho por bem suspender, adiar ou cancelar o festival, a alternativa que juridicamente for menos contestável por parte do sindicato e eu não sei qual dessas ações devo adotar. Nós comunicamos aos artistas sem o DRT e dos quais temos os emails, pois não temos de todos, que o sindicato estaria fazendo um plantão na praça Frei Baraúna, na semana passada. Até onde eu saiba, só uma pessoa procurou o sindicato e pagou para tirar o seu DRT. Eles querem que nós façamos o festival, desde que todos os envolvidos regularizem sua situação trabalhista. Se alguém não regularizar eles embargam o pagamento. Se realizarmos o festival sem a correta documentação estaremos cometendo os crimes de, entre outros, formação de quadrilha, segundo a Ligia, via telefone para o Ricardo,da ATS. Se todos regularizarem sua situação e o festival acontecer, eles processaram a prefeitura por não estar pagando o piso a cada participante e a ATS por aceitar uma verba que não permite pagar o piso a todos os participantes, também segundo a Ligia ,para o mesmo Ricardo e na mesma ligação telefônica. Bom, se os artistas não se apresentarem não haverá crime de exercício ilegal da profissão e se a Prefeitura não pagar, também não haverá o crime de estar remunerando nenhum artista abaixo do piso. Por favor, consulte o departamento jurídico da prefeitura e peça para eles redigirem uma resposta ao email abaixo, para que eu possa responder a esse SR Ricardo Azevedo. Estaremos realizando uma reunião amanhã, às 1930min, na R. Penha, 823 3º andar, com a classe artística para explicar o porque o festival foi, suspenso, adiado ou cancelado e aberta a todos os interessados na questão.
A ATS se justifica perante a essa Secretaria, pois jamais foi nossa intenção envolvê-la em situação irregular, quiçá criminal. Que a lei alegada pelo
sindicato quanto a regulamentação da profissão data 1978 e , nestes 32 anos, foram realizados muitos festivais de teatro em Sorocaba envolvendo amadores, seja organizados pela ATS, seja pela própria Prefeitura nas versões ícaro e Tropeiro, ou por outras entidades. Que se tratando o Sated de uma organização estadual e que, se dirige a Sorocaba seu olhar e ação jurídica tão contundentes, nos ocorre a pergunta: será que em todos os municípios do estado de São Paulo está ocorrendo esta fiscalização e suas possíveis sanções às associações, prefeituras e grupos? Você tem como saber isso? Você agiu certo em pedir a documentação para o Sated, a que regulamenta o fomento à Arte e Cultura, pois todos correm riscos, além da própria prefeitura - os grupos amadores que se apresentam publicamente, os contemplados pala LIC , enfim todos que não tem DRT e não pagam a contribuição sindical ao Sated.
Agradeço em especial a você Zezo, por sua atenção em intermediar a dotação da verba para a realização do FLITS, quando isso ainda era possível e ao Anderson pelo apoio ao Flits e a essa associação.
Abç, Nanaia

6 – 26/08/2010 – Reunião entre artistas, ATS e SeCult decide pelo cancelamento. Os artistas presentes emitem uma carta de repúdio.

“Repúdio”

Nós, artistas sorocabanos, reunidos no dia 26/08/2010 subscrevemo-nos para expor nosso repúdio à forma como a entidade - Sated -criada para nos representar se apresenta de forma tão autoritária, intolerante e anti-democrática.
Queremos nos reservar o direito em sermos amadores ou profissionais, optarmos pela profissionalização, a partir do momento que isso nos beneficie e não o contrário. Ressentimo-nos com a ausência de um representante do SATED para dirimir nossas dúvidas em relação à profissionalização. O anseio pela profissionalização, no entanto, deve ser proporcional ao “mercado” em que cada um atua. Sendo assim, mais uma vez falta bom senso aos senhores representantes do SATED, quando mostram todas as suas garras contra um “festival notadamente amador”, que só tem beneficiado Sorocaba.
Em resumo, queremos deixar claro que não nos sentimos representados pelo SATED, e estamos no aguardo de uma reunião produtiva que inverta essa situação.
Um Sindicato tem por finalidade:
-Esclarecer
-Oferecer benefícios aos sindicalizados;
-Mostrar sua importância em prol da área que defende;
-E SÓ POR ÚLTIMO FISCALIZAR E PUNIR.
Responsabilizamos o SATED pelo prejuízo e falta de informação, caracterizando uma irresponsabilidade que acarretou no cancelamento do VI Flits, além de causar danos emocionais e financeiros aos grupos participantes do referido festival, que investiram nas suas produções por conta de apresentar ao público sorocabano o melhor de suas criações artísticas.

Subscrevemo-nos:
Eli André Corrêa
Pedro Fontes
José Antonio de Almeida Barros
Tiago Mantovani –
Dener Mota
Giovanna Delmônego Lourenzetti
Isadora Simas Esteves de Albergaria Lomardo
Juliana Gonçalves Felippe
Bruno César da Silva
Augusto Roberto
Luciano Rodrigues Leite
Felipe Santos da Cruz
Stefania Mendes de Oliveira
Santiago Ribeiro
Rodrigo Cintra Marins
Priscila Maldonado
Alexandre David Cavalcanti
Geisa Helena de Oliveira
Daniele da Silva
Mariana Filosi
Cindy Góis Vicente
Clayton David Balduino
Roberto Gill Camargo
Ricardo F. O. Devito
Daniel Gouveia
Lucas Augusto Buffalo Marques
Marcimedes Martins da Silva
Flávio Vieira de Melo
Marcelo Pereira
Marina Simas Esteves
Ivaldo José de Carvalho
Guilherme Augusto de Toledo Costa
Guilherme Martellini
Rafael Rodrigues Ramos
Marcelo Domingues
Ana Diniz

7 – 27/08/2010 – Comunicado da ATS o sated confirma cancelamento do Festival

de Marina Esteves
para conselhoetica@satedsp.org.br,

ccAndré / sated ,
presidencia@satedsp.org.br,
mapersico@hotmail.com,
ZEZO/SECULT Secult
Ibraim Ramos

data27 de agosto de 2010 00:30
assunto RE: FESTIVAL LIVRE DE SOROCABA
assinado por yahoo.com.br

Prezado Dr Roberto,
Comunico-lhe que o VI FLITS - Festival Livre de Teatro de Sorocaba foi cancelado. A ATS não pode se responsabilizar " pelo tirar o DRT" por parte dos participantes, pois essa é uma ação particular de cada um e que depende também de uma avaliação, por parte dos senhores quanto a capacitação para a profissionalização de cada pretendente, o que poderia não acontecer e isso nos colocaria numa situação de descumprimento da lei. Esta foi uma decisão conjunta da ATS, Prefeitura e Classe Teatral, que assim por bem o decidiu.
Atenciosamente, Nanaia de Simas
Presidente da ATS

8 – 29/08/2010 – Um matéria do jornal Cruzeiro do Sul torna pública a questão


MAIS CRUZEIRO – [ 28/08 ]

Impasse com sindicato leva ao cancelamento do Festival Livre de Teatro Amador
José Antônio Rosa

Notícia publicada na edição de 28/08/2010 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 2 do caderno D - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.

Um impasse entre o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Estado de São Paulo (Sated) e a Associação Teatral de Sorocaba (ATS) determinou o cancelamento da sexta edição do Festival Livre de Teatro Amador (Flits), que começaria amanhã.
O motivo da divergência tem a ver com a regulamentação do exercício da profissão de ator. Baseado na legislação que trata da matéria, o Sindicato exigiu que os grupos participantes comprovassem o registro de seus atores e técnicos no Ministério do Trabalho (DRT), ou obtivessem autorização para poder encenar as montagens. A ATS alega não ter condições de atender a recomendação, nem de assumir obrigações por outras pessoas.
A discussão se arrasta já há quatro meses quando o secretário da Cultura, Anderson Santos, mediou um encontro entre a organizadora do festival e a direção do Sindicato. Naquela oportunidade, eu sugeri que eles conversassem e tentassem chegar a um acordo, usassem do bom senso, contou Anderson ao Mais Cruzeiro.
O tempo passou e as partes não se entenderam. Mais recentemente, o Sated enviou mensagem à ATS, na qual destaca que o não cumprimento das providências poderia caracterizar crime de exercício ilegal da profissão e falsidade ideológica e, ainda, gerar responsabilidade ao poder público.
O assunto teria chegado, inclusive, ao conhecimento do prefeito Vitor Lippi (PSDB). Anderson Santos submeteu o imbroglio ao departamento jurídico da Prefeitura, que recomendou a suspensão do festival até que tudo ficasse melhor esclarecido.
Foi essa a decisão comunicada aos atores e diretores que participaram, na quinta-feira, à noite de reunião para debater o encaminhamento da questão.
Ricardo Devito, tesoureiro da ATS, considerou a posição do Sated arbitrária.
Como ele, produtores e artistas que tomariam parte no festival também entendem que o Sindicato teria recorrido à coação para aumentar o seu quadro de sócios. É curioso que nos últimos cinco anos, o Flits tenha sido realizado sem que fôssemos avisados ou orientados a fazer qualquer coisa.
A suspensão, conforme a ATS, deverá acarretar muitos prejuízos. Os grupos já tinham se organizado, estavam com tudo pronto. Agora, para ajudar, não existe espaço na agenda do Teatro Municipal para que possamos, eventualmente, realizar a mostra numa nova data.
De quebra, a orientação pode fazer com que os futuros editais da Lei de Incentivo à Cultura (LINC) obriguem os produtores de teatro a providenciar o registro de seu elenco, ou a autorização do Sindicato para que os mesmos trabalhem. Anderson Santos não descarta essa possibilidade: Se formos orientados a fazer isso, faremos.
Diretor do grupo Barracão da Vó, que apresentaria O Estrangeiro Misterioso, Rodrigo Cintra
comentou: Sempre achei que os sindicatos existissem para nos apoiar. Não entendo como uma ação restritiva possa somar na defesa da classe. Eu sou inscrito no DRT, mas acho tudo isso lamentável.
Coincidência, ou não, a agenda deste ano do festival estava tomada de boas atrações. Participariam os espetáculos O Ébrio, com o elenco do Circo Guaraciaba; Resumo de Ana, de Rodolfo Amorim, com o Grupo Manto; A Rainha do Brasil, de Hamilton Sbrana, Essas Mulheres, da Trupe & Calha, Vila Judá, do grupo Epidaurus, O Estrangeiro Misterioso e A Sombra da Terra, de Marcelo Domingues, com o Núcleo de Teatro Experimental Corpos Oníricos.
O outro lado
Ouvido pela reportagem o representante regional do Sated em Sorocaba, Mário Pérsico, disse estranhar a resistência das companhias da cidade em se profissionalizar. Para nós do Sindicato não existe diferença entre amadores e profissionais naquilo que se refere à proteção, à segurança, às condições de trabalho.
Pérsico acredita que o problema tenha um componente cultural. As pessoas, aqui, se habituaram a um modelo e se bastam com isso. ‘Sempre foi de um jeito, não prá que mudar agora?, costumam dizer. Isso já está superado. Embora alguns não entendam, ou não queiram entender, estamos apenas cumprindo nosso papel de fiscalizar.
Mário não concorda com as colocações de que o Sated estaria decretando o fim do teatro amador na cidade. Isso é um absurdo! Eu, mais do que muita gente, sei da importância do teatro amador. Não existe, absolutamente, obrigatoriedade de ninguém se associar ao sindicato. Queremos, apenas, garantir que todos trabalhem dentro do que a lei estabelece.
Ele também negou que tivesse havido ameaça, intimidação ou coação aos artistas. As mensagens só diziam que descumprir a lei, tem implicações, a que todos estamos sujeitos.
O presidente do Conselho de Ética e Fiscalização da entidade, Ricardo Vasconcelos, explicou que desde 2002 tem orientado os artistas de Sorocaba sobre a importância de atender ao que estabelece a legislação.
O Sated, ainda segundo Vasconcelos, tem agido com rigor em todas as situações. Acompanhamos o Festival de Rio Preto e a Virada Cultural deste ano. Em todas as mostras e eventos que contem com a participação de atores é necessário cumprir a regra. Nas novelas, é possível ver, nos créditos, um aviso de que o Sated autorizou a participação de atores que não possuem DRT. É uma prática comum.
Vasconcelos disse, ainda, que o Sindicato se dispôs a emitir autorizações em tempo hábil para que o festival fosse realizado. Disponibilizamos funcionários para o atendimento. Não era nada tão complicado assim. A autorização vale por seis meses e custa R$ 80.
O assunto deve render mais discussão. A Associação Teatral de Sorocaba estuda mobilizar os atores para cobrar providências e não descarta ingressar na justiça para cobrar os prejuízos que alega ter sofrido com a suspensão do festival. De outra parte, o secretário da Cultura, Anderson Santos, defende o diálogo e acena com a realização de encontro entre todas as partes para tentar resolver a situação. Estamos à disposição, no que nos couber, para ajudar, arrematou.

NAS PRÓXIMAS POSTAGENS, A REAÇÃO DOS ARTISTAS LOCAIS E OS DESDOBRAMENTOS DE UMA DAS MAIS SURPREENDENTES AÇÕES DE CENSURA E REPRESSÃO, PERPETRADA POR UM SINDICATO, DESDE A RETOMADA DA DEMOCRACIA NO BRASIL.