por Isabella Reinert
Vinte e
um anos. Da perplexidade inicial pouco restou.
Ao entrar
para o Degase, o contato com os adolescentes infratores foi a confirmação da
miséria que há muito nos assola. Que espécie de sociedade produz tanto
desamparo? Havia entre os profissionais recém-chegados do concurso uma vontade
de realizar um bom trabalho, e em alguns casos, de transformar aquele precário
estado de coisas. Os primeiros embates, naturalmente, aconteceram entre os
trabalhadores remanescentes das instituições que atuavam por anos com uma cultura
consolidada no antigo Código de Menores, e os animados concursados inspirados
no Estatuto da Criança e do Adolescente. Como qualquer outro lugar onde há
privação de liberdade, o exercício da força e seu abuso são uma constante.
Havia a
esperança de que o ECA seria assimilado com o tempo, e naquele momento ele
tinha apenas quatro anos. Uma lei muito jovem, que mudava paradigmas, com os
desafios de ser implantada, ainda mais em um país onde as leis “pegam” ou não.
Este
conflito persiste até hoje, vinte e um anos depois, com algumas mudanças na
parte física das unidades, mas quase nada na estrutura do atendimento.
Exatamente
agora, dentro do ônibus, indo para um Seminário organizado pelo Degase, vejo
pela janela uma ação policial. Estão fortemente armados e conduzem um homem
jovem para uma viatura. Inevitável pensar que este tipo de coisa não causa
surpresa ou apreensão. Passageiros entram no ônibus, riem ao passar pela roleta
e encontrarem um lugar para sentar. É mais um dia igual a tantos. Se as
manifestações de violência são frequentes, banalizam-se. Se suportamos até
agora, podemos prosseguir, afinal nossa capacidade de acomodação é ilimitada.
Mais viaturas
ao longo do caminho, e a possibilidade de algo estar acontecendo inquieta.
A poluição
da Baía de Guanabara é extrema, o mau cheiro invade o ar. A corrupção domina as
manchetes, e exala o mesmo odor podre. Tudo faz sentido. O que se deduz é
terrivelmente coerente. Os resultados
medíocres na recuperação de jovens infratores incomodam aos profissionais que
acreditavam em suas ações, não ao Estado que enseja e patrocina a miséria. Os
dividendos da pobreza são desejáveis, rendem discursos inflamados, subsídios
eternos e um porvir sem cor.
Vinte e
um anos. Para mim, tantos. Para nós, tão pouco.
Isabella
Reinert Thomé
Dezembro
de 2015
Isabella Reinert Thomé é professora, cantora, atriz e perfumista. Concursada pelo Município e pelo Estado do Rio de Janeiro, trabalhahá 21 anos como Professora de Artes Cênicas e de Perfumaria do DEGASE (Departamento Geral de Ações Socioeducativas, antiga FEBEM).
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