domingo, 4 de outubro de 2015

ARRASTANDO DEMAGOGIA, de Mario Vitor Rodrigues

ARRASTANDO DEMAGOGIA – Mario Vitor Rodrigues
http://noblat.oglobo.globo.com/artigos/noticia/2015/09/arrastando-demagogia.html
27/09/2015

     Uma parede humana avança sobre os banhistas; pavor e insegurança. Sem que se saiba de onde, começa uma grande confusão, o pânico toma conta da praia. As pessoas correm em todas as direções, são mulheres, crianças, pessoas desesperadas à procura de um lugar seguro. A violência aumenta quando gangues rivais se encontram. Este grupo cerca um rapaz que cai na areia e é espancado. A poucos metros dali, outro bando avança sobre a quadra de vôlei, os jogadores se afastam e cercam as barracas para proteger mulheres e crianças. Dois policiais, apenas dois, chegam até a areia, eles estão armados mas parecem não saber o que fazer com tanta confusão e correria. Perto dali, um rapaz ignora a chegada dos policiais para roubar. Ele se abaixa, pega uma bolsa de praia e corre. Veja de novo, ele é seguido pelos companheiros de gangue, que impedem a aproximação das pessoas.

Se ainda existiam dúvidas sobre a profundidade alcançada pelas garras do populismo de esquerda entre nós, desde o último fim de semana já não faz mais sentido tê-las. Não após o nível do debate provocado pelos arrastões em Ipanema.

Afirmo sem medo, jamais teria vez em uma sociedade lúcida, para não dizer bem intencionada, a inversão de valores defendida nas abordagens sobre o tema. Uma ladainha já conhecida, neste caso determinada a relativizar furtos e assaltos, que teve como alicerces as falácias de sempre: injustiça social, racismo e violência policial.

Sobre o primeiro ponto, sequer vale a pena estabelecer comparações com países de perfis sócio-econômicos similares ao nosso. Seria dar fôlego aos interessados em se aproveitar do mais puro e simples banditismo para fortalecer discurso ideológico.

Já a premissa de amalgamar pessoas ao bel-prazer, diga-se, utilizando a cor da pele como desculpa, é oriunda da mesma conversa. A partir de então, fica cômodo colar selos no indivíduo e instrumentalizá-lo em benefício próprio. Nem que seja para posar de bom moço em papo de bar, ao julgar e absolver seus crimes.

Quanto aos abusos da polícia, obviamente devem ser observados com atenção pela sociedade, interessa a todos que o rigor da lei também se imponha aos bandidos de farda. Mas nada justifica engolir discurso orquestrado para impor generalizações interesseiras - como por exemplo, de que nem todo favelado seja bandido, mas de que todo policial necessariamente seja violento, fascista e corrupto.

Nesta hipótese, percebam, não resta saída para a polícia. Se decidir esperar pela ação criminosa, falhará duplamente, antes, por ter permitido o delito, e depois, ao usar de força excessiva na hora de deter o bandido. Se, por outro lado, decidir prevenir, como qualquer polícia deve fazer, será acusada de preconceito. Uma armadilha retórica boçal, mas que virou dogma de tão difundida.

Claro que a popularidade deste nocivo raciocínio não foi alcançada da noite para o dia. Muito pelo contrário, representa uma construção iniciada há décadas, tanto nas escolas, como nas faculdades, via jornalistas e formadores de opinião. Graças a ela, noves fora a já fossilizada culpa católica, o brasileiro emburreceu a ponto de aceitar com normalidade a carapuça de carrasco. Até mesmo em casos assim, quando claramente é a vítima.

Antes de regurgitarmos ideias falidas, seria mais sensato lembrar os milhões de “pretos e favelados”, como gostam de dizer os arautos da superioridade moral, que certamente não têm vida fácil, mas saem de casa todo dia para trabalhar honestamente, e não para se divertir saqueando, impondo o terror e agredindo quem encontrarem pela frente.

em tempo: Ainda ontem, o adolescente flagrado durante o arrastão declarou ao O Globo que roubou “por prazer”. Torço para que sua declaração sirva pra intimidar um pouco quem, consciente ou inconscientemente, ajuda a subverter um mínimo de bom senso que ainda deveria nos restar.

Fulanos assim, que saem de casa para roubar e agredir, que superlotam ônibus e comportam-se de maneira ameaçadora, devem, sim, ser detidos pela polícia. O que não pode, é um comportamento claramente anormal, de afronta, ser contemplado candidamente como se nada fosse, quando todos sabemos muito bem do que se trata.


O que, aliás, o trecho em destaque no início deste artigo - transcrito de uma reportagem veiculada no Jornal Nacional, sobre um arrastão na mesma Ipanema há 23 anos -, deixa muito claro.


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